‘A vida não é fácil, e daí?’1 dizia a capa do livrinho, ilustrada com uma foto da cientista Marie Curie, sustentando meu olhar meio de lado, com o rosto apoiado em uma das mãos, algo entre o desafiador e o provocativo.
Polonesa, Marie Curie imigrou para a França, onde se formou, se casou, se investiu nos estudos, se dedicou à família e às duas filhas e viveu a maior parte da vida. Foi a primeira mulher a receber 2 prêmios Nobel em duas áreas diferentes e também foi colecionadora de pioneirismos.
Era essa a mulher que desafiava: ‘e daí?’
Para ela, ‘devemos ter perseverança e, acima de tudo, confiança em nós mesmos. É preciso acreditar que somos talentosos para algo e que isso deve ser alcançado, a todo custo.’
Se você leu o livro ‘A ridícula ideia de nunca mais te ver’, de Rosa Montero, sabe que Marie seguiu isso à risca, apesar de e também por causa de todas as dificuldades e desafios que se impuseram.
‘E daí?’.
Em novembro de 2021, quando topei com o chamado em um café livraria de Paris, eu não tinha resposta alguma. Estar ali, inclusive, era parte da busca. Andar a esmo pela minha cidade, visitar o museu dedicado a Marie Curie, o que mais desse vontade e fosse possível. Mais de um ano depois a pergunta seguia me rondando, assim como uma frase do filósofo francês Charles Pépin no livro ‘A confiança em si - uma filosofia’.2
Toda vez que você admira [uma pessoa], contempla o brilho de uma estrela singular. A cada vez, você vê o brilho possível da estrela que está em você.
Marie Curie teve uma vida marcada por infelicidades, episódios de machismo e xenofobia mas também por feitos admiráveis e contribuições inestimáveis à ciência e à humanidade. E, não menos importante, nutriu uma vida familiar e pessoal significativa. Ao admirar Curie, vê-se possibilidades. Eu via.
‘E daí?’
Perseverar, apesar de. Acima de tudo, confiar. ‘A vida não é fácil, e daí?’. Daí que os verbos de ação vão se encadeando e assim seguem, mudanças espiralares. Aquietar, escutar, perseverar, confiar, contemplar.
Em um certo Ano Novo, Marie Curie enviou uma mensagem à filha Irène Joliot-Curie e ao genro Frederic Joliot-Curie, ambos também laureados com o Nobel.
“Desejo-lhes um ano de saúde, satisfações e bom trabalho, um ano em que sintam prazer de viver todos os dias, sem esperar que os dias tenham de passar para encontrar satisfação e sem a necessidade de depositar expectativas de felicidade nos dias vindouros. Quanto mais se envelhece, mais se sente que saber gozar o presente é um dom precioso, comparável a um estado de graça".3
Gozar o presente, não ter que esperar os dias vindouros para encontrar felicidade. Há desejos que são atemporais, não é mesmo?
Que 2024 seja assim para você. É isso que desejo.
‘La vie n’est pas facile, et alors?’, publicado pela L’Orma Éditions, sem tradução para o português.
Charles Pépin é um “filósofo pop” francês, como são por aqui Mário Sérgio Cortella ou Leandro Karnal. No Brasil, seus livros são publicados pela editora Estação Liberdade.
Marie Curie, citada por Rosa Montero no livro “A ridícula ideia de nunca mais te ver”, que recomendo fortemente a quem se interessar por saber mais sobre Marie Curie e também por refletir sobre a condição feminina.
Fosse fácil, chamava férias.. Não vida. Adorei a edição. ❤️❤️❤️❤️
Amei!